MADEIRA DE DERIVA

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Estava ouvindo Antonio Zambujo, o cantor português que fez um show recentemente no Rio – já vi dois shows deste artista, sou confessadamente apaixonado por seu tom de voz, repertório e jeito de cantar. E repentinamente ele começa a cantar uma música em espanhol (perfeito…), com Mon Laferte, uma cantora-compositora-atriz chilena, que eu não conhecia. Uma delícia de música…e, sabe-se lá o porquê, lembrei-me (por causa do título) da excepcional instalação do artista Henrique Oliveira no MAC USP, em São Paulo, cuja foto abre este post. O trabalho de Henrique é fenomenal, ele invade espaços ou surge de paredes como se a natureza fosse retomar um espaço perdido, assustador e poético como poucos.

Já conhecia e admirava o trabalho deste artista, mas esta instalação era imensa, caminhava-se através/dentro dela, e nos provocava curiosidade, um tiquinho de receio, e seu trabalho além de conceitualmente forte ainda se apresenta de forma impecavelmente bem construído. Confesso que fui algumas vezes para rever esta obra, que considero deveria fazer parte do acervo do Museu para todo o sempre, apesar de seu gigantismo. Não sei qual relação me fez lembrar do conto de Julio Cortazar, A Casa Tomada¸ talvez peça sensação de sentir a natureza retomando seu lugar de forma intensa, definitiva e aparentemente natural. Fascinante é pouco para descrever a obra deste artista, segundo meus princípios.

 

E esta obra me levou a outro trabalho, absolutamente distinto em termos formais, mas cujo uso da madeira é maravilhoso – a obra e o show-room do designer Paulo Alves, que ocupou um espaço interessantíssimo no centro da cidade de SP, em frente à Biblioteca, com um projeto expositivo de impacto. Paulo sempre trabalhou a madeira de forma clara, reforçando a diferença das madeiras e expondo seus veios e qualidades de forma extremamente elegante.

Fotografia: Wair de Paula

E este show room, localizado numa insólita esquina do centro paulista, tem realmente um set design no mesmo patamar do produto – e o círculo de banquinhos feito com roxinho, uma madeira ligeiramente desprezada pelo design brasileiro, é a prova desta qualidade. A aparente simplicidade do desenho parece estar à mercê de que a matéria prima se destaque, o que é um discurso diferente da maioria dos designers, que quer impor a matéria prima à sua vontade.

Paulo tem peças “mainstream”, mas é nas peças que saem deste discurso que seu talento brilha mais – como nas cadeiras Bo Bordadeira acima. Eu tenho em casa uma cadeira de costureira, cujo assento é bem mais baixo do que o comum, e essa preciosidade que reverencia Lina Bo Bardi imediatamente me fez lembrar da minha cadeira, que era usada em tempos imemoriais de mulheres de vestidos longos e costureiras fazendo bainhas sentadas nestas cadeiras baixas. Esta cadeira tem um apelo visual fortíssimo, e se apresenta em vários tipos diferentes de madeira, reforçando o discurso da diversidade de madeiras que é o forte deste designer.

O café do Instituto Moreira Salles SP, situado em plena Avenida Paulista, foi o cenário perfeito para os banquinhos deste designer. Usufruir desta arquitetura fantástica, neste museu dinâmico de vernáculo contemporâneo, aproveitando os sabores de um café coado na hora em uma das mais agitadas avenidas de São Paulo, é um dos paradoxos da cidade da “…dura poesia concreta de suas esquinas…”, como já cantou Caetano.

Ainda no campo do designer que explora a madeira em sua magnitude, o banco Jacaré, um produto do Atelier Atlas , do designer Thiago Mendes, também segue o discurso – necessário e contemporâneo – de valorizar o trabalho manual e ter gerência sobre o processo, do começo ao fim. Aqui o lúdico desenho deste banco remete diretamente aos bancos dos povos originários, apesar- ou talvez por causa disto – de sua concretude visual.

Feita em cedro rosa maciço e torneado, as luminárias AO, do mesmo Atelier Atlas, se apresentam em tamanhos de 30 a 155cm. Foi interessante ver o processo de criação desta peça, que começou de uma forma e com a lâmpada reta, e terminou com estas formas e tamanhos e a lâmpada ligeiramente deslocada de seu eixo. Isoladamente, ou em grupo, elas se impõem no cenário em que forem colocadas, tamanha simplicidade formal e impacto visual.

Fotografia: Wair de Paula

E é da designer Noemi Saga o cabide acima, sutil, uma geometria maravilhosamente limpa – como são várias peças desta designer. Aqui, a inspiração foi o processo de lapidação das pedras preciosas, que revela o brilho e revela a beleza destas. E, através do corte e polimento da madeira, Noemi reforça sua inspiração original, em um cabideiro extremamente simples e decorativo ao mesmo tempo.

E aí está a beleza destes produtos e obras deste post – as insólitas e infinitas ligações com arte, com música, com literatura, com a natureza. Assim como uma música de um cantor d´além-mar inspirou este post de produtos 100% brasileiros.

Artistas: @henriqueoliveira.studio / @pauloalvesdesign / @atelier.atlas / @noemisaga_atelier

 

Wair de Paula Jr.

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Tag: madeira

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