Quando se trata do assunto Design de Interiores, eu nunca uso a expressão “…excesso de informação”. Por considerar que informação nunca é excessiva, neste campo. As casas cheias de ornamentalismos – objetos, quadros, móveis, livros, cores, sempre me chamaram a atenção.
Eu prego que aceito o conceito Less is More se nesse Less tiver um grande quadro de Mark Rohtko sobre um sofá de Vico Magistretti ladeado por uma luminária de Gae Aulenti, um Raimundo Colares de respeito em outra parede, um Giacometti em um canto da sala e um pequeno Brancusi repousando na mesa de centro. Estes elementos me forneceriam a informação necessária para eu viver de modo dinâmico, são mestres em seus ofícios e sempre geraram conteúdo através de suas obras e produtos.
Pensei nisso ao me deparar com a parede do atelier de Matisse, que abre este post. Uma coleção de seus cut-outs, formando uma padronagem absurda, feérica, de enternecer o mais duro dos espíritos. Ou alguém ousaria dizer que “é muita informação” numa só parede?
Não fui à Milão este ano, mas o que vi pelas redes, sites e afins me deu um alento – as cores e elementos decorativos fizeram a festa. Não apenas Paola Lenti, que sempre se esmera em apresentações acachapantes (e que este ano contou com o auxílio de um criador que venero, Oki Sato – a.k.a. Studio Nendo), mas várias marcas, grandes ou pequenas, famosas ou ainda desconhecidas, ousaram inserir seus produtos de uma nova forma, com cores mais ousadas, dentro de um ambiente mais “carregado” na informação. Não se consegue criar, excepcionais e originais produtos todos os anos (exceto Oki Sato, este consegue…), então vimos algumas marcas mostrarem seus produtos sob outra roupagem, outra estética, em um valoroso exercício de valorização da mão de obra.
Quando estive no Marrocos, muitos anos atrás, me encantei com aquela mistura de elementos, matérias nobres como alabastro ou pedras semi-preciosas e prata misturados à outros não tão nobres como cerâmica, barro, era um manancial incontido de referências.
Lembro vividamente de um restaurante que tinha um piso cerâmico monocromático mas de intrincado desenho (eram dois ou três formatos da mesma cerâmica formando padrões quase caleidoscópicos), que conviviam em pé de igualdade com requintadas colunas de puro alabastro extremamente polido, e os habituais lustres em metal perfurado com vidro, criando um cenário de luzes, sombras e reflexos inesquecível – isso sem contar o jantar em si, uma profusão de pratos coloridos temperados por especiarias igualmente coloridas, maravilhoso para todos os sentidos.
Foi neste hotel que vi uma sala de banho parecida com esta acima, mas no lugar do preto-e-branco uma infinidade de tons de verde adquirida pela comunhão de mármores, jade, alabastro, cerâmicas foscas e polidas. Curvas, arabescos, intrincadas padronagens transformavam aquela sala de banho numa sala de sonhos.
Uma das vantagens desta estética é a de que não se faz necessário, sempre, que o espaço seja grande. Os europeus são mestres em transformar espaços de dimensões mais reduzidas em ambientes únicos, cheios de personalidade, cor e objetos das mais diferentes origens e referências. Como a sala acima, que tem todas as cores do arco-íris e mais algumas.
Absorvam a maravilha do espaço acima, uma residência na região da Andaluzia, Espanha. O teto com desenhos irregulares em perfeito match com o tapete, os arcos ora emoldurados de branco, ora de preto, as cadeiras em tecido maravilhoso, e este festival de cactos sobre este tom divino-maravilhoso de terra…é um luxo, e mesmo que os produtos fossem adquiridos de produtores e/ou lojas mais acessíveis, o resultado é luxuoso até a última linha. Isso é uma masterclass de como lidar com contrastes e drama dentro de um projeto.
O ornamentalismo não é necessariamente excesso. Aqui, com apenas três componentes, este universo está bem exemplificado – um biombo em imensas pastilhas de vidro e latão, uma poltrona de desenho exótico com tecido idem, e um painel em alto relevo ao fundo já compõem uma atmosfera de luxo, informações de várias épocas e origens, uma riqueza de detalhes que nos faz parar, ficar olhando e pensando: como será que pensaram nisso?
Essa é a beleza deste conceito – as informações se originam de várias épocas, culturas, mesclando manufaturas distintas. Claro que é preciso um espírito livre para criar – e absorver – esta estética. Mas eu prefiro o Toddy ao tédio, como já disse a poetisa. Estes ambientes me arrebatam.
Às vezes, um pequeno detalhe pode fazer mita diferença – como é o caso deste tecido colocado no fundo deste armário com portas de vidro (e da pintura interior em azul arrematando o conjunto). Tem algo de oriental neste desenho, que contrasta com o desenho art-dèco deste armário em elegante diálogo.
Eu já o imagino cheio de taças transparentes, modernas e antigas, Baccarats, Saint Louis e algumas marcas mais contemporâneas, mexedores de drink feitos na ilha de Murano, jarras de vidro veneziano, todo um universo estético contido dentro destas portas.
O ornamentalismo tão tem medo. Ele só teme o tédio, talvez. Eu teria o sofá acima, desenhado na década de 1930, com muita vontade…Eu adoro estes intrincados trabalhos de marcenaria, estofaria, quando o handmade se sobrepõe visualmente ao tecnológico.
Eu não prego uma volta ao passado, não é este o assunto. Eu só gosto de ver a valorização da mão do homem sobre os componentes, mesmo que a tecnologia esteja embutida. E há de se convir que estes aspectos ainda valorizam uma mão de obra qualificada, e valorizar este tipo de recurso ainda nos possibilita participar da melhoria de condições de vida dos produtores, fabricantes, artesãos…
Lançada recentemente em Milão, as luminárias e acessórios do Mingyo Xu Studio espelham bem essa estética. Incorporando técnicas ancestrais a um desenho e formas contemporâneas, trouxe as fibras naturais (principalmente bambu e derivados) de volta para nosso universo, adicionando a estes objetos um caráter de unicidade, luxo e valor, ao repensar esta ancestral matéria prima sob uma ótica moderna, lúdica, extremamente original.
A empresa milanesa Vito Nesta, um Estúdio de design de interiores, mostrou em seu espaço uma retrospectiva de Alessandro Guerriero, fundador do Atelier Alchimia (1976) e um dos fundadores da Domus Academy (1982), e desta retirei as cadeiras Alchimie acima. Únicas, simples e maravilhosamente únicas, eu que sou doido por cadeiras e poltronas literalmente enlouqueci ao ver estas peças cheias de charme, um certo humor, esta estampa e pintura sobre uma estrutura clássica, uma provocação que criou um diálogo entre culturas e épocas distintas…sou fã desta dialética, deste conceito, desse cross culture.
Em suma…prego, sobre todos os aspectos, a valorização de espaços únicos, onde a covardia dos espaços beige/cru/cinza (ou fendi, que sequer cor é…) seja sobrepujada pela ousadia da cor, das formas, da mistura, uma grande, cosmopolita e global geléia geral. Essa estética é uma ode às identidades distintas, e este discurso não pode ser mais contemporâneo. Oxalá vejamos mais este conceito no futuro próximo…
Já segue a Conexão Décor?
Siga o nosso Instagram e Facebook e acompanhe as novidades sobre decoração, arquitetura e arte.