DONO DE MIM

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Sou da geração que tinha secretárias e contava com office boys no escritório. Eles atendiam a porta; e elas, o telefone. Eles iam ao banco e ao correio, levavam e traziam memorandos e documentos, carregavam nossas pastas e outras tralhas.

Elas transmitiam os recados, datilografavam nossos escritos, organizavam a agenda, chamavam o táxi, reservavam as passagens, passavam os telex e depois os fax, pediam a água e o cafezinho a outros auxiliares…

No trabalho e na vida num todo, neste meio-tempo absorvemos a tecnologia em forma de computadores e celulares, e ganhamos o auxílio dos motoboys, por exemplo, que podiam pegar e entregar nossas encomendas, depois de perguntar: “é só isso só?”.

E mesmo adotando novos modismos em forma de clichês como a “mudança de paradigmas” em tempos de “rever nossos conceitos”, confesso que não vi o tempo passar, não prestei a devida atenção!

Virei meu próprio produtor, secretário, assistente, administrador.

Abro a porta, recebo e faço diretamente as ligações, assim como as operações bancárias on line, escrevo e envio meus textos finais, incluindo os das redes sociais (uma nova obrigação), chamo o táxi, tento comprar passagens aéreas em promoções na madrugada, nem sempre com sucesso, e coloco tudo na mochila que penduro nos ombros.

Ainda que cansado de tudo isso, além do trabalho em si hoje me sinto um real “dono de casa/escritório” e único dono de mim.

Porque também em casa não basta cuidar de si (lembre-se de fazer seu exercício, a meditação e cuidar da saúde!) e da família, pois temos que fazer a parte prática: compras, lavação de roupa suja e da louça também. Dar cabo da limpeza geral, passando vap, mop e aspirador.

E ainda ter um olho nos pets e o outro nas plantas.

Fala sério: você está conseguindo trabalhar com a mesma criatividade e empenho e obter o mesmo rendimento de antes?

Ou apenas eu estou vivendo esta nova realidade na qual só consigo ter um tempo para me concentrar enquanto lavo e/ou passo álcool nas mãos, desinfeto os sapatos e tomo banho?

Estou precisando ler um livro que não seja ligado ao trabalho; assistir a uma série na TV que não precisa ser a mais recente (e nem sequer comentar); tomar um chopp ou mais sem qualquer compromisso no boteco; fazer um esporte apenas por prazer; conversar com alguém sem visar uma oportunidade.

Talvez descansar ao sol, e não pensar na vitamina D; comer sem se preocupar com a balança; ou mesmo dormir mais, no silêncio e no escuro, e com o ar-condicionado à toda.

Quem sabe nesta paz e desprendimento, ou quem sabe em um sonho elucidativo, eu vislumbre alguma solução para este problema que, me parece, não é apenas meu.

Ou será?

Sergio Zobaran

 

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