Conheci Fernando e Humberto Campana em seu início, antes de sua exposição “Desconfortáveis”, produzida por Adriana Adam, que literalmente lançou a dupla ao mercado. De lá para cá eles construíram uma carreira internacional, trabalhando com as maiores marcas de design do mercado mundial, participando de exposições e projetos dos mais variados.
Infelizmente Fernando Campana nos deixou em 2022, aos 61 anos de idade, mas seu irmão Humberto continua honrando o nome que os catapultou para a fama, com produtos cada vez mais criativos e surpreendentes. O cartaz acima é de uma exposição recém terminada, na Power Station Art e Shanghai, comemorando os 40 anos deste Estúdio.
Ao chegarem nesta exposição, denominada “Impernanência – 40 anos do Estúdio Campana”, os visitantes se deparavam com a escultura acima, “Astro”, inspirada nas imagens do universo produzidas pelo telescópio espacial Hubble.
Com doze metros de altura, segundo Humberto Campana, “…a transparência e a estratificação dos materiais evocam o aspecto ‘não material’ da peça, algo que venho explorando há algum tempo…Estou entusiasmado por estrar trabalhando novamente em esculturas, pois é uma forma de expressão que sempre gostei.” Mas esse apreço sempre se manifestou nos produtos do Estúdio Campana, seus móveis têm um caráter escultórico que, não raras vezes, superou o caráter funcional.
O tapete Cangaço (foto acima), de 2023, executado em lã, fibra de bananeira e fibra de bambu, produzido pela Nodus, reforça este caráter não formal onipresente nos produtos deste estúdio.
Tenho a sorte de ter um tapete desenhado pela dupla em minha casa, um produto feito originalmente para o Teatro Municipal de São Paulo, e cujo fabricante me honrou com a possibilidade de tê-lo em minha casa, ao lado de outros tapetes muito, muito velhos, em perfeita harmonia. O bom design se permite a isso, ele ultrapassa as fronteiras do tempo para se firmar em um espaço onde esse tipo de mistura (épocas, estilos) se funde em um conceito muito particular.
O puff feito de pandas de pelúcia (uma derivação da série, feita com bichinhos de pelúcia, jacarés de pelúcia, etc) é um daqueles produtos que parecem terem sido pensados para provocar.
Ou para inspirar – não posso deixar de lembrar de meu amigo Edgard Octávio, que era Visual Merchandiser da extinta Daslu, que, à época da abertura desta megaloja de luxo, fez um espelho imenso cuja moldura era toda cercada de ursinhos de pelúcia, e uma poltrona igualmente forrada com esse quociente de fofura inigualável.
Ambos – os Irmãos Campana e meu amigo – anos depois me inspiraram a criar, para um evento beneficente de uma grande marca de móveis planejados, um coração totalmente forrado de mini ursinhos de pelúcia. Ideias criativas se tornam referências que podem ser utilizadas em vários momentos, em circunstâncias distintas. Copiar não pode, mas se inspirar em boas ideias é sempre permitido.
Quando vi o lançamento da linha Atuxuá, uma colaboração com uma galeria em Mumbai, India, eu capotei. Que maravilha, que ideia deslumbrante, que execução maravilhosa…esse encontro de tradição e modernidade, presentes nesta linha, me seduz até o último fio.
Feita com fibra natural (palha Sabai) e latão, segundo Humberto este trabalho representa um paralelo entre a espiritualidade, os rituais e o sincretismo religioso que podemos encontrar tanto na Índia quanto no Brasil.
Eu imediatamente lembrei-me da figura de um orixá, Omolu, o orixá da cura, das doenças e da terra, que se apresenta com o corpo todo coberto com uma longa franja de palha. Desconheço se alguma divindade indiana se apresenta desta forma, mas nem discuto este fato – acho este móvel simplesmente deslumbrante, apoteótico, uma maravilha sob todos os aspectos.
Ainda na comemoração dos 40 anos do Estúdio Campana, bem como da duradoura colaboração com a veneranda casa Louis Vuitton através dos produtos denominados Objets Nomades, recentemente esta marca de luxo abriu uma exposição no espaço LV Dream, na capital francesa, onde revelou o Kaléidoscope, um armário com assinatura do Estúdio para a Maison, e também foram expostas oito novas versões da cadeira suspensa Cocoon, que homenageiam o folclore brasileiro.
Nomeadas de Curupira, Jaci, Boiuna, Iara e Boto, elementos do folclore brasileiro, estas versões da Cocoon tem revestimentos estranhos, diferentes do habitual – como é de costume na práxis do Estúdio Campana.
Junto à exposição, ocorrerá a exibição do filme We The Others, lançado neste ano, que conta a história dos irmãos Campana desde a fundação do estúdio, em 1984.
A exposição na LV Dream terá uma curta duração, inaugurou dia 16 de outubro, e está localizado em um histórico edifício no centro de Paris – 26 Quai de la Mégisserie, 1er – que abrigou durante a segunda metade do século XIX uma fantástica loja de departamentos, La Belle Jardinière.
Acima, o Armário Kaléidoscope, uma peça nada banal, rica, opulenta – e aqui, faço um adendo. Se, no começo da carreira, os Irmãos Campana lidavam com o acaso em suas soluções (a cadeira Vermelha, feita com 300 metros de corda, é um exemplo padrão desta situação), com a matéria prima determinando a forma – vide a poltrona Favela – agora este estúdio parece estar fazendo uso do melhor da tecnologia para gerar produtos de alto impacto visual e impecável qualidade construtiva – ainda mais por contarem com parceiros do quilate da Louis Vuitton.
Humberto Campana ainda é um jovem, com 61 anos, e sua potência criativa parece estar no auge – como provam os dois armários anteriormente citados, duas peças de inegável impacto estético, com propostas conceituais e construtivas diferentes, fazendo uso do melhor da manufatura mesclada às informações do passado. Oxalá vejamos mais e mais produtos by Campana.
Maiores informações e ingressos, através do site: www.eu.louisvuitton.com
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