PRAÇA XV – o coração do Rio colonial

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Todos os sábados, a Praça XV, no Rio de Janeiro, vira uma agradável feira de antiguidades onde é possível encontrar desde móveis de grande porte, como sofás e cômodas, até coleção de moedas e broches. Vai do micro ou macro. É uma riqueza de objetos históricos que dá vontade de explorar cada canto daquele espaço público. Esse é o mundo contemporâneo, onde estamos revalorizando e ressignificando peças antigas (ainda bem!), pela simples razão de mesclarmos, como a fluidez de um líquido, o passado com o futuro.

Feira de Antiguidade na Praça XV, todos os sábados. Uma boa pedida para quem gosta de histórias
Feira de Antiguidade na Praça XV, todos os sábados. Uma boa pedida para quem gosta de histórias. / Foto: João Torres

Mas as vezes esquecemos de que exatamente naquela praça, a história do Rio de Janeiro nascia. Ali foi o coração da cidade durante séculos, desde o XVI. Dessa vez, a Revista Conexão Décor vai elucidar o leitor a conhecer melhor a história da Praça XV, dividindo em dois episódios. E hoje, começamos com o primeiro, sobre a ocupação.

1º episódio: TERRA

Se fizermos alguma obra urbana ali, é certo que encontraremos muitos objetos arqueológicos que testemunharam o nascimento da cidade, pois ali foi, junto com o “falecido” Morro do Castelo, o primeiro lugar que os portugueses habitaram definitivamente no Rio de Janeiro. (“falecido” porque, em 1922, o morro já não existia mais. Foi demolido, ainda por motivos duvidosos, mas oficialmente em prol do progresso – lamentável).

Como o morro não era grande, em poucos anos ele já estava totalmente ocupado pelos portugueses com construções e, por isso, a necessidade de descer até a várzea (atual Praça XV). Ali, as terras baixas para ocupação foram concedidas a nobres e fidalgos, a partir de 1568, pois a Cidade Alta (o topo do morro) já poderia descer e se espalhar pela Cidade Baixa.

Gravura de Friedrich Salathé da Praça XV, entre os anos de 1825-1834, do álbum Souvenirs de Rio de Janeiro .
Gravura de Friedrich Salathé da Praça XV, entre os anos de 1825-1834, do álbum Souvenirs de Rio de Janeiro .

Mas não pensem que foi fácil!

Descer do morro significaria novos desafios. Antes de mais nada, a coragem: o alto era mais seguro, já embaixo, nem tanto. Depois, a parte baixa precisou de um imenso e árduo esforço de engenharia para drenar os alagadiços, os pântanos e os encharques típicos daquele terreno.

Como ali, na Cidade Baixa, já existia uma singela capela dedicada à Nossa Senhora do Ó (onde hoje está a Igreja Nossa Senhora do Carmo da Sé), a várzea foi conhecida desde o início da década de 1580 como “Várzea de Nossa Senhora do Ó” (esse foi o primeiro nome da atual Praça XV). Esta capela foi doada aos frades carmelitas, no final do século XVI, e construíram, ao lado da igrejinha, seu convento (hoje recém-restaurado, o Convento do Carmo – que também já foi nosso tema aqui na Revista Conexão Décor).

Convento do Carmo a esquerda e a Igreja de Nossa Senhora do Carmo da Antiga Sé a direita. Ambos pertencentes à irmandade dos Carmelitas, uma das responsáveis pela existência da futura praça.
Convento do Carmo a esquerda e a Igreja de Nossa Senhora do Carmo da Antiga Sé a direita. Ambos pertencentes à irmandade dos Carmelitas, uma das responsáveis pela existência da futura praça.
Mesmo não sendo exatamente na Praça XV, a litografia de Johann M. Rugendas (realizada entre 1827 e 1835) mostra um escravizado sendo castigado no pelourinho, em público.
Mesmo não sendo exatamente na Praça XV, a litografia de Johann M. Rugendas (realizada entre 1827 e 1835) mostra um escravizado sendo castigado no pelourinho, em público.

O nome da Praça XV foi bastante modificado no decorrer dos séculos. Inicialmente era “Várzea de Nossa Senhora do Ó”, depois conhecida como “Terreiro do Ó”. Em um certo momento chamada por “Terreiro do Polé”, porque lá foi instalado um tronco para torturar escravos castigados (o pelourinho). Ficou conhecido também como “Largo do Carmo”, em função do convento. E a partir de 1743, quando o prédio do atual Paço Imperial ficou pronto, a praça passou a ser conhecida como Largo (ou Terreiro) do Paço.

Paço Imperial em destaque através da gravura do prussiano Karl Wilhem Theremin, realizada em 1818.
Paço Imperial em destaque através da gravura do prussiano Karl Wilhem Theremin, realizada em 1818.
Aqui, Rugendas retratou a agitação da sociedade na principal rua da cidade, a Rua Direita, em 1835. É possível ver escravizados, comerciantes, eclesiásticos, guardas, capangas, ricos e pobres. Tudo junto e misturado.
Aqui, Rugendas retratou a agitação da sociedade na principal rua da cidade, a Rua Direita, em 1835. É possível ver escravizados, comerciantes, eclesiásticos, guardas, capangas, ricos e pobres. Tudo junto e misturado.

Pronto! A partir desta data, que a Praça XV definitivamente ganhou o seu formato quadrangular que existe até hoje. De um lado, a rua principal da cidade colonial do Rio de Janeiro: a Rua Direita (atual Rua Primeiro de Março), onde encontravam-se as principais igrejas, os mais importantes endereços comerciais, a elite e todo o “burburinho” local. No lado oposto, as águas da Baia de Guanabara, onde impera até hoje o monumental Chafariz da Pirâmide, do Mestre Valetim, que abastecia tanto a população quanto as embarcações. Formando o terceiro lado da praça também se encontra o Paço Imperial, uma imponente arquitetura que já foi Casa da Moeda, Casa do Governador-Geral e a primeira moradia da família real portuguesa. E em seu lado oposto, fechando o formato quadrangular, está uma construção colonial que já teve a sua importância, porém, hoje muito descaracterizada e diminuída de tamanho: o famoso Arco do Telles – onde inclusive um dia a Câmara já se instalou.

O chafariz mais importante da cidade colonial também foi retratado por Debret. Aqui é um pormenor de uma tela grande.
O chafariz mais importante da cidade colonial também foi retratado por Debret. Aqui é um pormenor de uma tela grande.

Enfim, por ser cercada de elementos importantes, significativos, potentes e de poder, como igrejas, palacete, pelourinho, comércio e a política – e também, obviamente, pela sua própria história – a Praça XV virou o coração da cidade colonial do Rio de Janeiro. Local de encontros e acontecimentos da sociedade carioca. E assim fechamos a primeira parte sobre esse tema: Terra.

No próximo episódio, contaremos a história da Praça XV e sua relação com as águas.

Lourdes Luz e João Torres – fundadores do Arte IN FORMA junto com Kátia Souza – felizes embaixo do Arco do Telles. Fotógrafa: Mariama Patriota
Lourdes Luz e João Torres – fundadores do Arte IN FORMA junto com Kátia Souza – felizes embaixo do Arco do Telles. Fotógrafa: Mariama Patriota (@mariamapatriota)

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Somos três historiadores da arte e arquitetos – Lourdes Luz, Kátia Souza e João Torres – que criamos o canal Arte IN FORMA por sermos entusiastas em arte, história e cultura. Acreditamos que isso pode informar, formar e transformar a todos.

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Tag: Praça XV

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