Os tais caquinhos

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Para quem vive de escrever, muitas vezes tem vontade de ter escrito aquela matéria ou aquela crônica que outra pessoa soube desenvolver tão lindamente. Confesso que além da admiração dá uma inveja… como negar? Às vezes é só o título que prende a atenção ou até a respiração de quem lê, sem nem notar se o que vem depois é interessante ou não. Ou justamente por isso dá vontade de continuar.  Pois foi o que aconteceu comigo quando vi o título de um livro (que ainda não li) de Natércia Pontes, “Os tais caquinhos”.

Venho desde então pensando nos caquinhos que juntamos pela vida afora. Nos nossos, nos dos outros, nos quebrados na cozinha, na sala e até nas casas alheias. Mas isso não cabe aqui nesse espaço porque “esse papo já tá qualquer coisa, você tá pra lá de Marrakesh”… (merci Caetano).

E por falar em Marrakesh, que viagem – dos caquinhos decorativos falarei em outra oportunidade – aterrissei nesse elemento que agora é recorrente na arquitetura e decoração: o cobogó.

Acreditam que muita gente não sabe o que é? Se for o seu caso, continue lendo, vai ser pelo menos ilustrativa, de tanto que se fala neles nesta grande aldeia da internet. Atenção, porque seu DNA é brasileiro.

Feito originalmente de tijolos ou cimento, esse elemento construtivo foi criado na década de 1920 em Recife, por três engenheiros: Amadeu Oliveira Coimbra, Ernesto August Boeckmann e Antonio de Góis, que buscavam uma maneira de dar privacidade aos seus projetos e ter ao mesmo tempo a capacidade de proporcionar ventilação natural. A junção da primeira sílaba do sobrenome dos três Co – BO – GO, passou a identificar a estrutura vazada que rodou o mundo e vem conquistando empresas e arquitetos.

Fachada do Instituto do Mundo Árabe, em Paris. | Jean Nouvel
Fachada do Instituto do Mundo Árabe, em Paris. | Jean Nouvel
Balcão em muxarabi, em uma casa em Minas Gerais,
Casa em Diamantina, MG.

Evidente que esse recurso arquitetônico inspirou-se nos muxarabis, os balcões suspensos e vazados através de uma espécie de treliça, tradicional no mundo islâmico, onde as mulheres deviam, e ainda devem, Ó Alah!,  ficar escondidas dos olhos dos homens. Mas a versão nordestina virou um tesouro arquitetônico brasileiro servindo de barreira cheia de charme ao que deve ficar na intimidade e permitindo a invasão de uma suave brisa.

Fachada em cobogós no Parque Guinle, projeto Lucio Costa - Rio de Janeiro/RJ, 1948 | Fotografia: Nelson Kon
Parque Guinle, Lucio Costa – Rio de Janeiro/RJ, 1948 | Fotografia: Nelson Kon
Parque Guinle, Lucio Costa - Rio de Janeiro/RJ, 1948 | Fotografia: Nelson Kon. Cobogós
Parque Guinle, Lucio Costa – Rio de Janeiro/RJ, 1948 | Fotografia: Nelson Kon
Conjunto Residencial Prefeito Mendes de Moraes (Pedregulho) | Affonso Eduardo Reidy
Conjunto Residencial Prefeito Mendes de Moraes (Pedregulho) | Affonso Eduardo Reidy
Cozinha com divisória feita em cobogós de cerâmica, na cor branca.
Projeto: Arquiteta Bianca da Hora | Fotografia: Denilson Machado
Sala com divisória feita com cobogós de cerâmica vermelha
Projeto do escritório Patrícia Martinez Arquitetura | Fotografia: Edu Castello
Instalação na loja Firma Casa com o cobogó Fitas, inspirado nas curvas do edifício Copan, em São Paulo. A peça foi idealizada pelos Irmãos Campana e produzida pela Divina Terra.
Cobogó Mão é um símbolo manifesto as tragédias ambientais em Minas Gerais. A peça foi idealizada pelos Irmãos Campana e produzida pela Divina Terra.

Adotado pelos modernistas, os cobogós foram usados em prédios que são referência ainda hoje projetados por nomes como Niemeyer e Lucio Costa e agora são os queridinhos do mundo da decoração. Seu uso mais constante é na divisão dos ambientes, apesar de alguns arquitetos terem “ousado” usar as cerâmicas esmaltadas e cimentícias em grandes fachadas obtendo um resultado fascinante. Vale vasculhar a história do conjunto Pedregulho de Reidy ou os prédios do Parque Guinle, alguns deles projetados por Lucio Costa.

Banheiro com Cobogó Mundaù (Premio iF Design Award 2022) é feito a partir da concha do sururu, molusco considerado patrimônio cultural imaterial de Alagoas. Assinado pelos designers Marcelo Rosenbaum e Rodrigo Ambrosio. | Fotografia:  divulgação Portobello
Cobogó Mundaù (Premio iF Design Award 2022) é feito a partir da concha do sururu, molusco considerado patrimônio cultural imaterial de Alagoas. Assinado pelos designers Marcelo Rosenbaum e Rodrigo Ambrosio. | Fotografia:  divulgação Portobello
Divisória em madeira, tipo cobogós
Cobogó Barras, ambiente de Ana Paula Castro. | Fotografia:  divulgação Tanto Revestimentos
Estante em madeira, feita com cobogós
Cobogó Tramas, ambiente de Ana Paula Castro. | Fotografia:  divulgação Tanto Revestimentos
Cobogó da Semana Criativa de Tiradentes, produzido pela Divina Terra.
Cobogó VES, design do escritório aflalo/gasperini, com formato versátil que permite explorar diversas aplicações e até mesmo em esculturas. | Fotografia: divulgação Manufatti Revestimentos.
Cobogó VES, design do escritório aflalo/gasperini, com formato versátil que permite explorar diversas aplicações e até mesmo em esculturas. | Fotografia: 3d aflalo/gasperini.
Cobogó Guarajuba, criado pelo escritório de arquitetura FGMF, é o ideal para o uso em grandes panos. | Fotografia: divulgação
Residência em fortaleza. Projeto: Zine Zink. Parede com cobogós Mão, dos Irmãos Campana. | Fotografia: Felipe Petrovsky
Varanda fechada com portas em treliça.
Projeto: Joaquim Meyer | Fotografia: André Nazareth

Atualmente os materiais realmente variam muito, feitos em cerâmicas, ferro e madeira, este último frequentador assíduo de interiores, pela delicadeza de suas inúmeras composições. Quer conhecer ou lembrar de um desses projetos? Vai lá na matéria publicada aqui na Conexão Décor no dia 7 de junho “Painéis cheios de mistério”, uma sensível e sofisticada criação do arquiteto Joaquim Meyer.

Suzete Aché

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