Por Paula Acosta, correspondente de Milão
PERCURSO TEMÁTICO DO LAKE COMO DESIGN FESTIVAL EXPLOROU DIÁLOGO ENTRE DESIGN, ARTE E HERANÇA ARQUITETÔNICA LOCAL
A cidade de Como, no norte da Itália, a cerca de 50km de Milão, é uma das localidades italianas mais conhecidas em todo o mundo pela sua beleza.
Encantadoras mansões neoclássicas com jardins impecáveis, erguidas entre o final dos anos de 1700 e as primeiras décadas de 1800, costeiam o famoso lago homônimo. Charmosas ruas estreitas convidam a se perder pelo centro histórico em busca de vestígios de épocas ainda mais remotas, como a romana (visível nas ruínas das termas de Viale Lecco ou nas colunas do Liceo Volta) e a medieval (Porta Torre é um exemplo).
Os olhos naturalmente se elevam diante de monumentos imponentes: é o caso da catedral, que mistura os estilos gótico, renascentista e barroco porque foi construída em três séculos e meio, de 1396 a 1744.
Avançando no tempo, a arquitetura racionalista, corrente surgida na Europa depois da Primeira Guerra Mundial, desponta em vários projetos assinados por Giuseppe Terragni (1904-1943).
É esse cenário fascinante que abraça o Lake Como Design Festival. A sexta edição do evento, que recebeu mais de oito mil visitantes, foi realizada de 15 a 22 de setembro e reuniu mostras, instalações, encontros e uma série de atividades especiais.
O fio condutor do percurso expositivo se baseava no conceito de “leveza”. Uma frase de Italo Calvino (1923-1985), presente no livro póstumo “Seis propostas para o próximo milênio”, serviu de inspiração: “Para mim, a leveza está associada à precisão e à determinação, não à vagueza e ao abandono ao acaso”.
A partir das palavras do célebre escritor, o mote do festival convidava a uma reflexão sobre a necessidade atemporal dos criadores de dar asas à imaginação e o compromisso com a busca de equilíbrio entre forma, matéria e movimento.
“O tema que escolhemos para este ano se pode expressar de inúmeras maneiras e encontrar a sua razão de ser em todas as diferentes formas de criatividade”, afirmou o idealizador e diretor artístico do evento Lorenzo Butti.
“Desenvolver exposições e projetos especiais que proponham uma comunicação entre arte e design sempre foi a característica estilística da nossa programação e a cada ano nos esforçamos para oferecer aos nossos visitantes um novo modo de olhar para essas disciplinas e para a criatividade em geral, inserindo as mostras em contextos arquitetônicos únicos que podem ser parte integrante do itinerário expositivo”, completou.
Na orla do lago, os protagonistas eram a esplêndida Villa del Grumello – com origem que remonta ao período renascentista tardio, ela funcionava como uma espécie de quartel-general do Lake Como Design Festival – e alguns pontos do chamado do “Kilometro della Conoscenza” (um corredor cultural e naturalístico de 15 hectares, que reúne parques centenários de residências históricas).
Depois de ultrapassar as portas da Villa del Grumello, mergulhava-se no universo onírico da mostra coletiva “Lightness in progress”. A beleza de cada aposento emoldurava uma sequência de projetos artísticos e coleções de móveis e acessórios de decoração.
Um destaque vai para a poética composição de objetos de papel da coleção “Impressions”, de Andrea Branzi, sob curadoria de Clio Calvi Rudy Volpi/Lithos, que causava um impacto imediato.
Assim como impressionava o incrível balanceamento expresso pela série “Close to the Edge”, de Mario Trimarchi: o peso físico e visual da pedra é associado à transparência e à fragilidade do vidro em peças que equacionam com perfeição a simbologia entre o natural e o artificial.
No pequeno cais para o qual o percurso interno confluía, a videoinstalação “Paesaggi d’acqua”, realizada por Niccolò Nessi e Stefano Larotonda, ressaltava o rico patrimônio arquitetônico localizado às margens do lago di Como.
O passeio pelo parque que circunda a propriedade presenteava o público com paradas para apreciar a “Contemporary Design Selection”, uma coletânea de projetos escolhidos por Giovanna Massoni e dispostos cenograficamente em estufas para plantas e capelas.
No centro da cidade, o percurso principal se articulava entre três endereços. O medieval Palazzo del Broletto, sede do município, recebeu “The Form of Lightness”, uma seleção de cadeiras que percorria a temática da leveza no arco de 100 anos. Entre as 28 unidades expostas – que contemplavam os mais diversos estilos, técnicas, períodos e proveniências – não poderiam faltar ícones como a “Superleggera”, projetada por Giò Ponti, e a “Ghost”, desenhada por Cini Boeri.
A pequena igreja desconsagrada de San Pietro in Atrio, construída por volta de 1200, abrigou “Lightness on Paper”, mostra que celebrava os 35 anos da editora local Lithos, especializada em impressões e livros de arte.
Criações de Mario Botta, Michele De Lucchi, DWA Design Studio, Nathalie Du Pasquier, Francesco Faccin, entre outros, interpretavam o conceito do festival através de antigas técnicas de gravura.
Já o Spazio Natta acolheu “8 Days of Lightness”, original proposta de uma dupla criativa da Letônia: Erlands é uma designer que imagina espaços e objetos a partir da sua orientação em práticas meditativas; Bai Bai é um artista que cria peças de vidro que proporcionam uma particular experiência sensorial.
Mas várias outras atrações enriqueciam o panorama da semana de design comasca. A galeria suíça Grieder Contemporary apresentou dois projetos especiais. Na sugestiva estrutura de uma ex-igreja de 1634, hoje denominada Borgovico 33, sete obras que pareciam flutuar no espaço, criadas pela artista alemã Jorinde Voigt com fios e correntes de latão, compunham a mostra “Contemplation Room”.
E em Cernobbio, cidade vizinha, Villa Anna foi o “palco” para “Weight of Illumination”, uma coleção de peças que, com inteligência, humor, surrealismo e surpresas, evidenciavam o dúplice significado da palavra luz em inglês (“light”), usado como referência à luminosidade e também à leveza. Além disso, instalações site-specific do artista Valerio Eliogabalo Torrisi foram posicionadas em diversos pontos de Como.
Era possível, ainda, ter acesso a espaços que nem sempre são abertos ao público, como estúdios de design, laboratórios de artesãos, ateliês de pintura e escultura. As principais exposições exigiam o pagamento de ingresso.
Se você estiver programando uma visita a Como para 2025, já pode pensar em combinar a viagem com as datas do evento, que acontecerá de 13 a 21 de setembro.
Paula Acosta / Comunicazione Carioca
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